Tá rindo de quê?
Um papo sério com Bruno Mazzeo,
que volta à TV e nega fama de pegador
Onze da noite de quinta-feira. Em frente à ala nova do Aeroporto Santos Dumont, refletores, caminhões e ônibus de figurantes chamam a atenção. Taxistas e aeromoças cenográficas se misturam a passageiros comuns e turistas que olham tudo meio fascinados, curiosos. Espero pelo entrevistado. Passa da meia-noite de sexta-feira quando ele chega. Não há lugar adequado para sentar e conversar calmamente. Então, encaramos o meio-fio da calçada mais próxima.
Bruno ainda bebê
Bruno, filho de Chico Anysio, comediante com rubrica na TV brasileira, não ficou à sombra da fama alheia e trilhou caminho com assinatura própria e sobrenome materno. É na escrita que tem seu melhor papel, mas joga bem como ator. Prestes a estrear “Tudo junto e misturado”, após quadros no “Fantástico” e a faceta de ter sido um sucesso na TV a cabo com “Cilada”, conseguiu levar para a rede aberta a sua galera.
Bruno é o cara da turma. Gosta de chope, é visto com frequência na noite e nas mesas do Baixo Gávea. Se flagrado com beldades, sente-se constrangido. Ser apontado como pegador não faz sua cabeça.
No Twitter, a rede social da internet que se tornou um vício para ele, é seguido por quase 450 mil pessoas. Nem sempre gentis e cordiais. Arrumou a maior kizumba com fãs de Luan Santana ao comentar que o sertanejo era vesgo. Mesmo fora do ar há um ano, há alguns meses o artista é um fenômeno. Por quê? Talvez por representar uma faixa de artistas que se expressa sem seguir o código velado de boas maneiras daqueles que se julgam deuses.
Como um rapaz latino-americano com dinheiro no banco e parentes importantes, Bruno conquista justamente por criar histórias críveis e divertidas, daquelas que parecem saídas da mesa do bar que você próprio frequenta. Não faz a linha bom-moço, mas preza pela relação de pai presente do pequeno João, de 5 anos, trabalha numa boa com a ex-mulher, torce doentemente pelo Vasco, tem preguiça de fazer terapia e odeia ignorância. Odeia mais ainda se ver na lista de celebridades: “Colocaram no mesmo saco o promoter de churrascaria, o ex-BBB e o Wagner Moura”. E acha cafona ser apontado como o novo Don Juan da praça: “É desagradável abrir meu computador e ver uma foto minha beijando alguém. Fico constrangido”.
Na lista de desejos profissionais está ser malvado: “Adoraria viver um vilão de Gilberto Braga”. Enquanto não acontece, ele promete chacoalhar o público. Com vocês, Bruno Mazzeo, um provocador nato.
— As pessoas acabam esperando que o humorista seja engraçado. Você não é. Sempre foi assim?
— Sempre fui mais sério, introspectivo. Nunca fui o gaiato da turma, apesar de ter uma tirada ou outra em mesa de bar. Não faço questão de ser gaiato. Se as pessoas esperam... Bom, devem esperar, né, é um clichê. Tem uma história clássica de um cara que mandou o filho bater no Mussum no aeroporto, e o Mussum revidou batendo no pai (risos). Ninguém esperaria isso do Woddy Allen, do Grouxo Marx, nem do meu pai, nem do Pedro Cardoso, nem do Jô Soares, nem do Marcelo Adnet, sabe? Gosto de humorista que fala sério. Quando vejo um humorista dando entrevista, por exemplo, quero saber o que ele pensa, do processo dele, de como faz para chegar numa piada. Sempre que assisto à entrevista de um humorista que está o tempo inteiro fazendo gracinha, acho meio gaiato. Não acho interessante.
Bruno com seu pai Chico e seu irmão Nizo
— Você se lembra qual foi a primeira cena que escreveu na vida?
— Profissionalmente, uma cena da “Escolinha do Professor Raimundo”, do Seu Baltazar da Rocha (Walter D’ávila). Só não lembro qual era. Meu pai foi o primeiro a notar meus escritos. Mostrava para ele, frequentava as gravações, e ele me incentivava muito.
— Você foi contratado aos 14 anos pelo Boni (ex-diretor geral da Globo) como roteirista, e tinha um salário simbólico. Se lembra do que dava para comprar com ele?
— Pô, não sei, até porque era outra moeda (risos). Mas devia ser algo em torno de R$ 200. Posso estar errado. O objetivo do Boni e do meu pai era que isso servisse de incentivo, tipo “Tá ganhando, vai querer escrever, vai se sentir empolgado”. E me sentia “o” responsável, “o” adulto. Para um moleque, isso é de enorme importância.
— Seu pai tem um personagem famoso, o Bozó, que tentava se dar bem por trabalhar na Globo. Rolou essa “bozozice” com você?
— Da minha parte, não. Mas das outras, sentia, sim. Sempre teve, até na faculdade, por parte dos professores. Uma parte achava superbacana eu ser filho de quem era, trabalhar na Globo, e outros faziam a coisa meio blasé, principalmente os professores. Uma coisa meio recalque.
— Como você era visto pelos outros roteiristas mais experientes? Era do tipo “lá vem o filho do patrão”?
— Nunca teve um olhar de reprovação. A galera me via como um mascote mesmo. Eu era o café com leite. Tinha uma ou outra coisa aprovada, utilizada, sabe? Era algo meio experimental. A maioria ali já estava com meu pai há muito tempo, já me via desde criança. Não era aquilo de “Olha o filho do cara”. Pelo menos, não que eu saiba.
Bruno e seu grande mestre Chico Anysio
Bruno e seu grande mestre Chico Anysio
— Mas, na época, você se achava “café com leite”?
Nããããão. Imagina! Me sentia superimportante. Não me sentia intimidado, era tratado de igual para igual. Ia para a reunião de autores, ficava ali ouvindo, era como eles, participava igualmente. Oficialmente, era de igual para igual, e essa era a minha sensação. É claro que essas conclusões só fui tirar mais velho, né, depois do distanciamento. Antes, era só um adolescente que achava que era adulto.
— Quais foram as vantagens e desvantagens de ter começado tão cedo?
— A vantagem é de, aos 33 anos, ser experiente o suficiente para entender certas coisas, como funcionam as engrenagens, “ah vou por esse caminho”... Não escolhi ser roteirista ou ator, fui arrebatado. A desvantagem não vejo hoje. Mas passei por frustrações de adultos ou tentei me levar a sério num momento em que podia estar pirando mais. Tive responsabilidade de gente grande quando não era gente grande ainda.
— Teve o momento de querer chutar o balde?
— Entre a “Escolinha” e o “Chico total” fiquei cinco anos sem escrever. Fui ter banda, viajar com os amigos. Era uma coisa consciente. Não queria mais fazer aquilo. Mas não deixei de fazer, porque sempre foi um prazer. Fazia como hobby, esquetes com amigos, programinhas. Preferia isso a pegar onda. Só comecei a surfar depois de velho (risos).
— Era bom como músico?
— Não, péssimo! Fiz dois shows. Cantava e tocava baixo. Cantava mal e tocava pior ainda, mas me achava incrível! Hoje, não sei tocar nada. Era a banda dos amigos do colégio, sabe? A banda Os Nomes.
— Quais os toques que “Seu” Chico Anysio dá no seu trabalho?
— Meu pai me deu toques na coisa do escrever, sempre muito precisos. Ele me dá até hoje. Aprendi vendo meu pai em cena, a respiração, a maneira de se conduzir um raciocínio para chegar numa piada. Ele me falou e mostrou coisas pegando meus textos e consertando. Meu pai é muito discreto e elegante nesse sentido. Ele não é um cara que vai ver um trabalho e sair falando sem que alguém peça para que ele critique. Às vezes, peço. O artista tem que confiar muito na sua própria intuição. Nas coisas em que ele acredita, e isso é comum, o cara que escreve tem que ter a sua verdade.
— “Tudo junto e misturado”, que estreia dia 1 de outubro, tem muito de “TV Pirata”. É proposital?
— Tem a ver porque é um programa de humor feito entre amigos e tem o Guel Arraes (também idealizador do ‘TV Pirata’) por trás. Mas é diferente na linguagem. Fazemos esquetes rápidas, são três programinhas num só, com muitas caracterizações, piadas curtas para raciocínios rápidos. É o humor que a gente gosta de ver.
Bruno e Rogeria num dos episódios do programa " CILADA"
Bruno e Rogeria num dos episódios do programa " CILADA"
— E como é fazer esse humor em tempos tão politicamente corretos?
— Não sei por que estamos vivendo esses tempos. Estamos em 2010, numa época livre, num país livre e, de repente, a gente vê um policiamento sobre tudo. No Twitter, se escrevo “Tô indo gravar”, gera um comentário do tipo “Tá reclamando de quê, seu fdp? Você podia estar desempregado”. Em qualquer coisa que a gente escreve rola patrulha. Ninguém pode ter opinião. Quer dizer, pode, mas tem que estar preparado para a pedrada. Não é uma censura, porque na censura não daria para falar. Iria preso. Tem artista que diz que não entra no Twitter, pois não está afim de virar a madrugada trabalhando e ler que alguém o chamou de fdp porque reclamou do cansaço.
— Mas o Twitter proporciona ao público ver o artista como pessoa comum. E pessoas comuns não são endeusadas, dão a cara a tapa...
— O Twitter deu microfone a quem nem deveria ter voz. Sinceramente, ninguém tem o direito de vir me chamar de fdp, embora esteja trabalhando feito um (risos). Estou há seis meses escrevendo um programa e, há quatro, ralando de segunda a segunda, virando noite, para um cara entrar no computador dele e escrever “seu globalzinho de m...”. As pessoas têm uma visão muito diferente. Essa indústria da celebridade bota no mesmo pacote o promoter de churrascaria, o ex-BBB e o Wagner Moura. Não pode! O Twitter é um instrumento de troca. Mas não sei o que ele deu a mim até agora. Um dia vou saber. Ou não.
— Você é fácil de lidar?
— Sou tranquilo. Profissionalmente, sou sempre a favor da melhor ideia para um programa. Se chegar com uma ideia e alguém achar que não é por ali, vamos chegar a um lugar comum. Não faço questão de que a minha seja a melhor. Gosto muito de parceria. Sou um cara de galera.
— Mas entre amigos também tem estresse...
— Todos os trabalhos que dependem de mim ou nos quais tenho possibilidade de escolher, opto sempre por amigos. Não tive ainda esse desgaste.
— Teve problemas em “A diarista”, não teve?
— É... tive. Mas quem não teve problemas ali? (risos) (Ele e Cláudia Rodrigues, a protagonista, divergiram sobre os textos do seriado e hoje nem se falam).
— Você é um pai presente para o João (fruto do casamento com a atriz Renata Castro Barbosa)?
— Como todo artista, tenho horários completamente loucos. Então, às vezes, sou ausente por conta disso. Mas tento ser o mais presente possível. Quando estava em turnê com peça, tinha estabelecido que, em fins de semana de Dia dos Pais e aniversário dele, não teria apresentação. É para evitar o que aconteceu comigo. Tinha Dia dos Pais, mas meu pai estava longe fazendo show.
— Sente culpa ou já culpou seu pai por isso?
— Não, porque é meu trabalho e sei que faço o possível para estar com ele. Nunca culpei meu pai, mas é possível que tenha sentido falta dele num torneio de futebol da escola, numa data importante. Sei que vou passar por isso também.
— Faz terapia?
— Já fiz três anos, parei, voltei. Mas, sabe, não tenho muito saco de ficar ali falando. Porque já falo tanto com meus amigos que, quando chego ao consultório, já ouvi todas as opiniões que precisava.
—Você está fora do ar há mais de um ano, mas de alguns meses para cá tem virado notícia. E muitas delas o apontam como o novo pegador da praça. Como se sente?
— O fato de ter sido pego em alguns flagras é uma questão estranha. Quando comecei a ser mais conhecido estava casado. Depois, fiquei solteiro. E foi, curiosamente, o momento em que fiquei mais famoso. Pô, é difícil estar numa festa e ficar me policiando, não curtir. E o mais louco é que as coisas aparecem... Essa fama de pegador... Mas não sabem se fui flagrado com uma pessoa e já estava com ela há seis meses. É desagradável.
— Muitos homens gostariam de ter essa fama...
— Não é legal. Primeiro, porque não condiz com o que sou. Segundo, que pode afastar gente bacana e, principalmente, o maior de tudo, é muito cafona. Fico constrangido quando abro o computador e tem lá uma foto minha beijando alguém.
— Tem algum desejo profissional ainda não realizado?
— Ser um vilão de Gilberto Braga! Quando penso no vilão clássico, penso no Gilberto. Odete Roitman, Olavo, Renato Mendes, Laura Prudente da Costa.... Vilões profissionais! Então quero muito fazer. Fica o recado.
FONTE\EXTRA
























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