sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Gaby Amarantos:
A história e a vida da estrela
 do tecnobrega paraense 
Como a garota da periferia Gaby Amarantos virou a 
rainha do tecnobrega sem perder sua essência 

Por Paulo Sampaio
"Meu peso não me incomoda. Isso só incomoda os outros"( Foto: Eduardo Monteiro ) Definitivamente, o clichê da moça simples que chega ao estúdio com roupas comuns e de cara lavada para se transformar em um mulherão assim que o fotógrafo liga as luzes e aciona a câmera não se aplica à rainha do tecnobrega paraense, Gaby Amarantos, que estourou com o hit Xirley. 
É que ela já vive montada. Só para dar uma ideia, Gaby trouxe de casa, lá de Belém, o modelão roxo com que aparece em uma das fotos destas páginas, além de sapatos de salto 17 na cor laranja-cítrica.
 Detalhe: ela viajou para o Rio de Janeiro sem shows marcados, o que significa que não havia motivo para pôr na mala um traje tão chamativo.
“Viu como foi bom trazer? Uso roupas que são a minha cara. Se deixasse os outros me vestirem, não seria eu de verdade”, diz a precavida Gaby. 
 Produzir a cantora foi, na verdade, desproduzila.Ou seja, para fazer uma foto dela “séria”, ou à paisana, a equipe da revista teve de submetê-la auma espécie de regressão visual intensiva. 
E Gaby curtiu o processo. “Tô achando ótimo colocarla do a lado a pessoa física e a pessoa artística!”
 Ela despontou junto com o tecnobrega, cujos primeiros registros datam de 2000, quando algumas bandas paraenses passaram a misturar diferentes ritmos, como carimbó, lambada, salsa e guitarradas, com todo tipo de ruído eletrônico. 
Hoje as apresentações dos astros locais são megaproduções que chegam a atrair 10 mil pessoas em catarse e, nas palavras de Gaby, fazem o público vibrar “como se estivesse tendo um ataque”. 
Mas a cantora criou um estilo próprio e o imprimiu no novo gênero musical. Suas referências e inspiração vieram de clássicos do brega, como Waldick Soriano, Fernando Mendes e Reginaldo Rossi, a Maria Alcina, Ney Matogrosso, Clara Nunes e Elke Maravilha.
 Ah, e ela adora Marisa Monte, a Tropicália e a Jovem Guarda. A alquimia deu tão certo que Gaby gravou músicas de sucesso quase imediato, como Ex Mai Love, trilha da abertura da novela das 7 da Globo, Cheias de Charme. 
Ela atribui muito de seu sucesso à escolha feliz de profissionais que “souberam pegar a música regional de Belém e sofisticá-la sem deixar que perdesse sua essência”. 
Entre eles o diretor musical Carlos Eduardo Miranda, o produtor Felix Robato e o DJ Waldo Squash. Boa de garfo Gaby tem 33 anos, 1,66 metro, 76 quilos e, apesar de estar acima do peso (para os padrões convencionais), é uma mulher leve. 
“Ela consegue flutuar quando dança. O que a Gaby faz no palco é digno de muitos parabéns. 
Porque existe o peso real, mas também a vontade de transformá-lo em pluma”, diz o coreógrafo Silvio Lemgruber, que a orientou para a recente edição da Dança dos Famosos, do Domingão do Faustão.
Também conhecida como a Beyoncé do Pará, ela garante que não sofre com a ditadura da magreza.
 “Meu peso não me incomoda; isso só incomoda os outros”, afirma abocanhando, no bar do hotel, um sandubão com batatas fritas. 
 Um de seus maiores prazeres é comer. “Não me lembro de nada de que eu não goste.
” Enquanto devora o lanche de emergência, atende muitas ligações de jornalistas e demonstra estar satisfeita com todo esse assédio.
 Leonina, ela “se acha”, mas da maneira mais natural do mundo. Admite que curte ser paparicada, sabe mandar e está aberta para o amor.
 “Essa história de não dar tempo para namorar, por causa da correria, não existe. 
O único problema que sempre enfrentei, e agora parece maior, é que os homens têm receio de chegar perto de uma mulher como eu.
 Eles esperam que a iniciativa seja minha.” Um tipo físico de preferência ela não tem. 
“Tem de ser homem que gosta mesmo de mulher. E que me trate de igual para igual.” 
 Bem-humorada, ela fala, fala, fala e enfeitiça o interlocutor com suas histórias.
 Conta que, na infância, sua mãe entrou em um curso de corte e costura para fazer as roupas dos filhos. 
A princípio, Gabriela, Gabriel e Gabriele seriam “cobaias”da aprendiz. 
“Mas eu inverti as coisas e transformei minha mãe em cobaia das minhas invenções”, lembra.
 “Cismei de querer uma bota que nem a da Xuxa, mas no Pará, por causa do clima quente, não se vendem botas. 
Minha mãe, então, fez uma de crochê rosinha pra mim e outra pra minha irmã. Ninguém na escola tinha igual.
”Gaby diz ser particularmente agradecida “às bicha”, que ajudaram a criar seu figurino peculiar.
 “O Guilherme Rodrigues, por exemplo, faz minhas coisas que acendem”, conta mostrando um casaquete com LED.
 Mas ela enfatiza que seu público não se restringe aos gays.
 “Olho para a plateia e vejo de tudo: homo, hétero, criança, velho, feio, bonito.
” Vestir-se como uma alegoria foi quase uma questão de sobrevivência para Gaby, que mora até hoje com os pais em uma casa que é também sede da escola de samba Coração Jurunense, fundada pela família. 
Fica em Jurunas, na periferia de Belém, onde ela nasceu e evoluiu. O pai, seu Conrado Espírito Santo, 60 anos, foi bancário e hoje faz serviços administrativos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). 
Já a mãe, dona Elza, 66, é dona de casa. Os dois são megaorgulhosos do sucesso de Gaby. Quando ela viaja para os shows, são os dois que cuidam de Davi, o filho de 3 anos da cantora. 
O pai do garoto “não convive” com a família. “Ele era muito legal comigo até saber que eu estava grávida”, conta ela.
 “Tive medo no início, mas logo veio uma força, um manto de energia positiva que me encheu de coragem. 
A chegada de Davi trouxe sorte, maturidade e garra para seguir. ” Intrigas na igreja Gaby não vê problema em dizer que foi deixada pelo pai de seu filho.
 Problema, segundo ela, seria esconder isso: “Acho uma loucura como as pessoas colocam capas, não falam de determinados assuntos. 
Eu falo mesmo: me tornei mãe solteira, não sou magra e minha bisavó era escrava.
Não entendo esse ‘coitadismo’, que leva alguém a não se assumir”. 
 Foi em Jurunas que, ainda na adolescência, um amigo maquiador, Daves, sugeriu a precoce criação de um nome artístico para Gabriela Amaral dos Santos.
 “O sobrenome original é muito comum, não tem a ver com os looks espalhafatosos que ela sempre gostou de usar. 
O Amarantos me veio à cabeça na hora”, diz Daves, hoje gerente de uma loja de cosméticos no Rio. Até então, Gaby era apenas a pessoa mais famosa da sua paróquia. 
 Ela começou a cantar aos 14 anos, na missa das 16 horas da Igreja de Santa Terezinha do Menino Jesus, que frequentava com dona Elza.
 Em pouco tempo, sua exuberância gerou intrigas.“As pessoas só queriam ir à missa em que eu cantava, e houve um complô para me afastar. Aí me comunicaram que eu teria de sair. 
”No mesmo dia, ela entrou em uma sorveteria para chorar as mágoas com amigos. Ali já descolou lugar para cantar.
 “Um cara se apresentava com violão. Dei uma canja e ele me chamou para ficar. 
”O repertório ia de Marisa Monte a Maria Bethânia. “Até que propus levar um breguinha. Sempre quis colocar uma ‘fuleiragem’ no meio”, conta ela, cujo primeiro cachê foi um prato de sopa.
 Gaby divide sua carreira em duas fases. Na primeira, integrou bandas de axé, lambada e brega, virou estrela local e ganhou algum dinheiro.
 Do mesmo jeito que veio, o sucesso se foi. “Não tinha mais trabalho, enfrentei dificuldade, foi ruim mesmo.” 
Mas ela logo deu uma rabanada de tule na depressão, soltou um “Xô, coitadismo!” e foi em frente. 
 O ressurgimento de Gaby Amarantos foi no Rec Beat do Carnaval de Recife, em 2010, quando entrou no palco às 2 horas achando que seria tarde para animar o público. 
Ela não só levantou a galera, como sua dança fez o povo se lembrar da superstar Beyoncé.
 “As pessoas começaram a gritar o nome dela sem parar e me senti na obrigação de criar uma versão para Single Ladies (sucesso da americana).
”Assim surgiu o hit Hoje, eu tô solteira. Uma de suas preocupações é “minimizar” os efeitosda fama em seu ego.
 “Já passei pelo sucesso e pelo esquecimento. Então, procuro encarar tudo com naturalidade.
 ”Com sua popularidade, seu cachê por show gira em torno dos 50 mil reais, mas ela não gosta de falar de dinheiro. 
Diz apenas que pensa em dar o melhor que puder a quem ama. “Cuidados médicos, boa educação, viagens, tudo o que eu não tive”, enumera. Em sua garagem, há dois carros. 
Antes de ter sua habilitação, há dois meses, Gaby contratou um motorista. Pretende manter o funcionário “até pegar segurança”.
 Mas deixa claro que, embora valorize os confortos, não quer perder sua essência jamais.
Pretende, por exemplo, continuar morando em Belém, no mesmo bairro. 
“Sempre que volto para minha periferia, lembro quem eu sou de verdade.”

FONTE\CLAUDIA

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