Denise Fraga:
“Vivemos um convite ao isolamento”
Em Chorinho, Denise Fraga interpreta uma moradora de rua que aponta as dificuldades nas relações humanas.
Fora dos palcos, a atriz diz que a peça a fez se abrir mais para as pessoas, comenta como é cuidar dos filhos em uma cidade “fria” como São Paulo e conta que tem planos de voltar à tevê no próximo ano.
Por Thaís Botelho
Numa praça de uma grande cidade, duas vidas se cruzam graças aos encontros e conversas de uma solteirona aposentada, personagem de Cláudia Mello, com uma estranha moradora de rua, vivida por Denise Fraga, entre preconceitos e solidão, loucura e lucidez.
De um lado, a personagem de Cláudia que só enxerga a vida em que vive, em uma casa normal e com suas atividades rotineiras.
Do outro, a moradora de rua, vivida por Denise, que insiste em aparecer para a aposentada e “colocar em pauta”, os problemas e a realidade que ela considera comum a todo mundo. “Hoje as pessoas não se falam.
Os telefonemas são substituídos por mensagens de texto no celular e as pessoas se privam do convívio”, explica Denise Fraga, em cartaz com Chorinho, com texto e direção de Fauzi Arap, no teatro Eva Hertz, em São Paulo.
A inusitada amizade entre essas duas mulheres aparentemente diferentes desperta a discussão sobre as relações humanas.
“Vivemos uma economia humana. Nos privamos muito do outro”, analisa Denise.
Chorinho traz um texto leve sobre situações da vida urbana. O que mais a atraiu para fazer a peça?
Tenho certa obsessão pelas relações humanas e adoro falar sobre isso. Também queria falar da dificuldade de convívio. Vivemos uma economia humana. Nós nos privamos muito do outro, com medo de nos comprometermos. Vivemos um convite ao isolamento, agora acelerado e munido pelo arsenal virtual da internet. Hoje as pessoas não se falam. Os telefonemas são substituídos por mensagens de texto no celular.
Em que momento a peça é mais marcante para você e por quê?
Em muitos. Uma das falas que me chamam atenção é a da minha personagem, moradora de rua, para a senhora aposentada. “Não adianta a senhora fingir que não me vê, porque eu estou aqui e não vou sumir.” Ela fala muita coisa que a gente já teve vontade de dizer. Ninguém quer o ônus do convívio. A peça também traz essa reflexão sobre o quanto nos privamos do outro.
A Cláudia Mello, que também está na peça, diz que termina a peça bastante emocionada. Acontece o mesmo com você?
Sim, muito. Eu acho que comecei a conversar mais com as pessoas na rua. Nessas conversas descobri que muita gente está lá por opção. Eu gosto de fazer a moradora de rua, chegar e me sujar inteira, de estar com os pés no chão. Experimento uma sensação de liberdade deliciosa. Estou buscando um lugar fora de mim e o desconhecido é muito mais rico. Depois disso, passei a me abrir mais para as pessoas, conversar mais.
Você chegou a dizer que uma das delícias de fazer essa mendiga é que ela diz coisas que as pessoas já quiseram dizer um dia. Como e o quanto se identifica?
Ela fala o que está na nossa cara o que vemos e não temos coragem de dizer. Eu procuro não me privar de nada. Como calo de ofício de ator, você tem mais interesse nas pessoas. Claro, há também o oposto, que é o ator virar personalidade pública, mas eu lido com isso com muita tranquilidade. Não posso me privar do material humano porque apareço na televisão. Eu vou ao mercado, ao estádio de futebol com os filhos, à feira. Não sou galã.
Você e o Luiz Villaça estão casados há anos e trabalharam juntos diversas vezes. Qual é o segredo do casamento duradouro?
Nós nos conhecemos bem e temos a feliz capacidade de sempre achar um meio-termo para tudo. Eu sou muito detalhista, ele é muito criativo e a gente se completa. É inevitável não levar trabalho para casa, claro, mas é bom. Sempre brinco que quem nos contrata nem precisa pagar hora extra.
Como é a Denise mãe do Nino, de 15 anos, e do Pedro, de 13? Falam sobre “tabus”?
Sou mais chata do que eu gostaria de ser e cobro bastante. Acho que está implícito “chata” dentro da palavra “mãe” (risos). É injusto ter de usar aquela voz imperativa que você não usa com ninguém e é obrigado a usar com as pessoas que mais ama. Mas sou dessas. Por outro lado, temos uma relação ótima e muito próxima. Falamos de sexo, drogas e o que tiver de ser falado.
Bate um medo de criá-los nesta metrópole “fria” de que a peça também fala?
A vida é isso. Temos uma relação sólida em casa e eu e o Luiz passamos princípios humanistas, consciência ambiental e sustentável etc. Quando fiquei grávida, todo mundo me perguntava: “Você não tem medo de colocar um filho neste mundo?” Eu respondia que não, pois acho que o mundo precisa deles. São pessoas de bem.
Você está fora da tevê desde 2009. Sente saudade da tevê?
Eu e o Luiz estamos trabalhando em uma série, mas está muito no começo, ainda não consigo falar sobre o trabalho. Tenho saudade, sim, e quero muito voltar. Deve ser no próximo ano.
FONTE\ISTOÉGENTE
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